Alcalá de Henares (EFE).- O espanhol Álvaro Pombo recebeu, nesta quarta-feira, das mãos dos reis da Espanha o Prêmio Cervantes 2024 e lamentou em seu discurso que a sociedade esteja “cada vez mais ininteligível” e que tenhamos sido “convertidos entre influenciadores e vendedores ambulantes”.
“Hoje segue sendo, talvez mais do que nunca, o grande tema: a fragilidade diante da doença, diante da solidão, diante da injustiça, diante da insegurança, diante da falta de convicções, diante das causas perdidas”, disse Pombo, que chegou em uma cadeira de rodas e cuja presença no evento ficou em dúvida até o último momento devido a problemas de saúde.
Em discurso lido pelo escritor Mario Crespo, o vencedor do Prêmio Cervantes se referiu à “fragilidade do ser humano diante das mais diversas instituições que parecem não ter proteção, em uma sociedade cada vez mais ininteligível”.
“Hoje em dia, ninguém luta um duelo pela sua própria honra, nem pela honra da Espanha, nem pela de ninguém”, disse o autor de romances como ‘Contra natura’ (2005) e ‘Santander, 1936’ (2023).
“Nos tornamos algo entre influenciadores e vendedores ambulantes”, disse o espanhol de 85 anos, após receber a mais alta condecoração da literatura espanhola das mãos do rei Felipe VI e da rainha Letícia, em uma cerimônia marcada pelo luto pela morte do papa Francisco.
Em uma cadeira de rodas, vestindo fraque, gravata preta e gorro de lã, Pombo compareceu à leitura de seu discurso no auditório da universidade, ao lado do ministro da Cultura espanhol, Ernest Urtasun, dos reis e diversas personalidades políticas e culturais.
Na abertura não foram realizadas as tradicionais honrarias militares; as bandeiras estavam a meio mastro, e tanto as autoridades quanto o laureado usavam preto, embora o hino espanhol tenha sido tocado.
Como já havia mencionado, Álvaro Pombo centrou seu discurso na fragilidade da obra de Cervantes, com citações de ‘Dom Quixote’ e ‘El Licenciado Vidriera’, considerando este ser “o grande tema que nos acompanha ao longo de nossa vida e de nossa vida cotidiana”.
Pombo confessou que escreveu este discurso, “Uma fenomenologia da fragilidade”, há muitos anos, para o caso de este prêmio “cair do céu” sobre ele, porque “reflete e expressa toda uma fenomenologia da fragilidade hispânica e da fragilidade do mundo, e da minha fragilidade também”.
Mas esclareceu que uma narrativa de fragilidade “não precisa ser uma narrativa frágil ou quebrável”, mas pode ser “tão inquebrável quanto o próprio texto de Dom Quixote de la Mancha”.
Pombo lembrou, como já havia mencionado na entrevista coletiva após o anúncio do prêmio, que atualmente está escrevendo um romance sobre a liquidação do colonialismo espanhol.
Também lembrou que Cervantes foi “um homem profundo e pobre”, segundo Ortega y Gasset, e acreditava que “é bem possível que para alcançar a grandeza na Espanha, para superar a fragilidade, todos nós tenhamos que atingir a profundidade e a pobreza”.
O júri de Cervantes, presidido pelo vencedor anterior, Luis Mateo Díez, reconheceu a capacidade de Pombo de criar “um mundo literário próprio e comovente” e sua “extraordinária personalidade criativa, estilo lírico único e original narrativa”. EFE