Paris, 20 dez (EFE).- Gisèle Pelicot, a sa que era drogada pelo marido para outros homens a violentassem, “não tem medo” de ter que ar por um segundo julgamento de apelação à violência que sofreu e o enfrentará enquanto sua saúde lhe permitir continuar demonstrando para todas as vítimas que, se ela pôde, outras também podem, segundo afirmou nesta sexta-feira Stéphane Babonneau, um de seus advogados.
“De qualquer forma, ela não tem medo. Em outras palavras, se acontecer, ela já nos indicou que vai enfrentar, se estiver saudável, obviamente, porque é uma mulher que já tem 72 anos”, declarou Babonneau em entrevista à emissora pública de rádio “ Inter”.
Os comentários do advogado foram feitos depois que dois dos 51 réus no julgamento na França pelas dezenas de estupros que sua cliente sofreu sob efeito de medicamentos já exerceram seu direito de solicitar um julgamento de apelação após as sentenças proferidas ontem no tribunal criminal de Avignon, no sudeste da França.
O então marido de Gisèle, Dominique Pelicot, recebeu a sentença mais severa – o máximo de 20 anos de prisão previsto por lei para esses crimes, embora ele possa ser elegível para liberdade condicional após cumprir dois terços da pena – como o estuprador e mentor da trama para que dezenas de homens desconhecidos estuprassem sua esposa entre 2011 e 2020, enquanto ela estava inconsciente por causa das drogas que ele lhe istrava.
Seus 50 cúmplices também foram considerados culpados de vários crimes, mas as sentenças proferidas foram menores do que a acusação havia solicitado, causando certa indignação na França.
Babonneau, no entanto, disse acreditar que sua cliente “ficou aliviada quando o veredicto foi anunciado, porque todos os réus foram condenados”, apesar de algumas reformulações das acusações.
O advogado disse que Gisèle está “feliz” em voltar para casa após o final do julgamento, apesar da ameaça de ter que participar de outro julgamento, que em segunda instância seria realizado no Tribunal de Apelação de Nimes e com um júri popular.
“Acima de tudo, o que ela não quer é que as vítimas digam a si mesmas ‘essa mulher tem uma força extraordinária, eu não conseguiria fazer isso’. Gisèle disse isso durante sua segunda declaração, ela quer que todas as mulheres digam a si mesmas ‘se a Sra. Pelicot fez isso, eu posso fazer’”, contou o advogado, antes de enfatizar que, apesar do apoio mundial, ela não quer ser vista como “um símbolo”, mas como alguém “muito normal”.
“Ela sempre disse que, em seu infortúnio, teve sorte por haver provas concretas do que vivenciou, porque em outros casos é muito mais complexo. Durante todo o julgamento, ela nunca deixou de nos dizer que seus pensamentos estavam com todas as mulheres, e possivelmente homens, que agora estão enfrentando a justiça sozinhos”, acrescentou.
Filhos, entre satisfeitos e decepcionados
Ainda não se sabe se Dominique estará entre os que apelarão do veredicto, pois, como sua advogada, Béatrice Zavarro, disse à mesma emissora de rádio nesta sexta-feira, isso dependerá do que ambos decidirem quando ela o encontrar na prisão em um futuro próximo.
Zavarro já havia expressado alguma insatisfação ontem, dizendo que o tribunal havia diferenciado demais seu cliente dos demais acusados, mas ela disse que teria que discutir com ele os “desafios” de tentar uma apelação.
Um dos três filhos do casal, David Pelicot, também se manifestou nesta sexta-feira, dizendo que estava satisfeito com a sentença dada a seu pai por causa das “atrocidades” cometidas contra sua mãe, mas que estava um pouco “desapontado” com as sentenças dadas aos demais acusados, que foram menores do que o pedido pela promotoria.
“Ganhamos uma batalha, mas não a guerra”, declarou ao canal “BFMTV”, além de enfatizar que se deve continuar a aumentar a conscientização contra a submissão química e os crimes sexuais em geral.
David lamentou o fato de que a filha, as noras e os netos de Gisèle, com toda a atenção que tem sido dada a ela, tenham sido um pouco deixados em segundo plano durante todo o processo.
“Há muitas perguntas para as quais não obtivemos respostas”, enfatizou, ao lembrar que também há uma queixa de seu próprio filho sobre supostos toques do avô, embora ele tenha se recusado a fazer uma declaração enquanto a investigação estiver em andamento.
Algumas imagens íntimas da filha e das noras também foram encontradas nos arquivos de Dominique (dezenas de fotos e vídeos que foram a principal prova nesse julgamento), mas durante as audiências ele negou ter abusado delas como fez com sua ex-mulher. EFE